Quando eu dizia, há dois anos atrás, que vinha morar em Bari, muitos perguntavam
espantados: "- Em Bali?! Por que tão longe?", ou então: "Bari...
Bariloche?". Não bastava dizer somente Bari, tinha que dar as coordenadas
geográficas: sul da Itália, no salto da bota, às margens do mar Adriático, com
vista pra Grécia e pra Albânia, só assim ia situando um pouco as pessoas. Hoje
estou aqui, em Bari, capital da Puglia, e finalmente decidi contar parte dessa
aventura. Este blog vai ser uma espécie de colcha de retalhos, se eu tiver tempo
pretendo falar de tudo que gosto e me interesso, mas quero principalmente falar
desta terra fantástica. Bem-vindos!

sábado, 26 de novembro de 2011

08 - BATENDO NO POLVO

Lembram do Paul, aquele polvo que ficou famoso durante a Copa do Mundo de 2010 porque acertava o resultado dos jogos? Pois é, o Paul aqui não teria tempo de alcançar a fama porque iria direto pra mesa, mas não sem antes levar uma surra.
O mar Adriático é prolífico em polvos, e o molusco é apreciado por todos. Na verdade a Puglia é conhecida em toda a Itália pela qualidade dos frutos do mar, parece que esta parte sul do Adriático tem algo de especial nas suas águas que faz com que o peixe seja especialíssimo, e dizem que os bareses são os únicos italianos que se deliciam comendo frutos do mar crus. Eles gostam de sentir o sabor do mar,  e por isso temperam muito pouco tudo o que pescam, um pouquinho de limão, sal pra quê, afinal o bicho vem do mar e portanto já vem salgado. São devorados crus lulas, sepias (parente da lula), mexilhões, ostras, ouriços do mar,  mariscos diversos (noci di mare, cannolicchio, e outros tantos nomes), e ele o polvo. Uma vez tirado do mar, nosso amigo Paul precisa ter a carne amaciada pra não ficar parecendo um chiclé e também pra aumentar o valor do produto. Quanto mais macio maior a procura. E como sabemos que aquele polvo é realmente macio? Fácil, é só percorrer o lungomare de Bari (a avenida beira-mar, já expliquei isso nos outros posts) e escolher um polvo que esteja apanhando. O processo se chama “sbattere il polipo” (bater o polvo). A gente vê dezenas de pescadores batendo no polvo com uma pá de madeira, quanto mais tempo apanham mais macios ficam, mas o processo completo exige ainda a “centrifugação”, que é colocar o animal numa bacia com água e sacudir aquela bacia, manualmente, por uma hora pra que a carne não fique pegajosa. Depois de tudo isso é só desembolsar uma boa quantidade de euros pra poder levar pra casa a iguaria, fresca e “sbattuta”.  E se não quiser comê-lo cru existem outras opções: fervido, ao forno, na grelha, em espetinhos como “churrasquinho”, mas lembre-se, sem nenhum tempero, depois de pronto umas gotas de azeite de oliva são permitidas. E buon appetito!

Este é um videozinho que fiz neste verão no lungomare de Bari, no momento que o polvo era "sbattuto".

Lulas e sepias (calamari e seppie)

Ouriço do mar (riccio di mare)

Noci di mare

Espetinhos de polvo

Nosso protagonista

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

07 - CHE SI MANGIA OGGI?

Hoje quero falar de comida!  Já não via a hora de fazer um post sobre a gastronomia da Puglia, por mim teria feito no segundo dia mas antes era preciso falar um pouco das minhas cidades adotivas, Adelfia e Bari, até pra fazer valer o nome do Blog também.

Acho que todo mundo sabe que a comida na Itália é um patrimônio cultural, comida é quase uma religião, o povo tem verdadeira devoção pela boa mesa.  Quando vim pra cá estranhava uma pergunta que ouvia insistentemente todos os dias: Che si mangia oggi? (o que se come hoje?) . No início pensava  que me perguntavam porque queriam saber  se eu,  por ser brasileira, cozinhava algo raro, exótico, ou indo um pouco mais além, já pensando de forma maldosa eu me dizia: “ihhh!!!esse povo tá querendo saber se eu sei cozinhar”, ou então porque queriam bisbilhotar a vida dos outros.  Depois de um tempinho me dei conta que a pergunta era dirigida pra todos,  no bar, na rua quando se encontrava um conhecido, na fila do  supermercado, até o frentista do posto de gasolina depois de receber o pagamento e antes de dizer ciao, arrivederci, vinha com a pergunta: che si mangia oggi? Foi aí que comecei a entender a importância da comida pra eles,  comer é o momento mais importante do dia e é sagrado.  Mas o ritual não parava na pergunta, a resposta trazia uma descrição elaboradíssima do que comeriam como primeiro e segundo pratos.  Cada  prato tem seu nome próprio, não se pode dizer simplesmente: massa! É preciso dizer o nome da massa, tipo: cavatelli ai frutti di mare, ou orecchiette al cime di rape, se a gente diz orecchiette, perguntam de que forma será preparado.  As massas, por exemplo, têm um tipo de preparação pra cada uma e são milhares de tipos,  não se resumem em spaghetti, fettuccine, penne, cappelletti, ravioli, gnocchi (nhoque), lasagna, cannelloni,  pra citar aquelas que lembro nos supermercados brasileiros. Então é preciso aprender que ao estilo aglio e olio, por exemplo, só se pode fazer  o spaghetti,  que alla carbonara só vai bem com fettuccine e spaghetti, e assim por diante... É preciso anos pra aprender tudo isso! Eu estou no pré-primário da cozinha italiana, quem sabe dentro de mais alguns anos eu consiga dizer  rapidamente e em detalhes che si mangia oggi!
Aqui ficam algumas dicas do que comer em Bari, aquilo que é típico da Puglia. E amanhã conto mais!





Em primeiríssimo lugar a focaccia, que é o lanche de todas as horas.Tá na rua e falta ainda um tempo pro almoço? Entre numa focacceria e peça a tradicional, com tomate e azeitona,  a focaccia tem batata na mistura da massa e é uma delícia. Também substitui tranquilamente o almoço, e um pedaço custa entre 1 euro e 1 euro e 50 centavos.
(foto: web)
Se preferir provar a autêntica pizza barese, indico duas pizzarias impressionantemente boas:  
1. Al Bucco, na  Via  NITTO DE ROSSI 2/a, aqui o site:   http://www.pizzerialbuco.com/    - quem gosta de verdura sugiro a pizza de cime di rape, e tem também a de sponzale (cebolinha) con ricotta dura, que é sensacional! Mas antes peça o delicioso antispasto!
2. Da Donato, na Via SAGARRIGA VISCONTI, 13, aqui tem um link que fala deles: http://www.oraviaggiando.it/Ristorante-Pizzeria-Da-Donato-Bari-Ristoranti-tipici-regionali-S26845.html , o antipasto é também maravilhoso!
(foto: web)
Se quiser provar a massa típica, o orecchiette, o mais tradicional é pedir al cime di rape, uma verdura da família do brócoli, porém a parte que se prepara são as folhas que são muito longas.
Outros dois pratos tradicionais são riso, patate e cozze (arroz, batata e marisco), e fave e cicoria (fava com chicória).
Riso, patate e cozze  (foto: web)
Fave e cicoria  (foto: web)



terça-feira, 22 de novembro de 2011

06 - BARI VECCHIA

Bari Vecchia, também chamada de “città antica”, ou ainda “centro storico”, é um mergulho naquilo que se pode chamar  a Bari profunda,  a identidade da cidade.  É ali que  podemos conhecer realmente a essência de Bari.   Bari Vecchia é autêntica,  é popular, pelas ruas as pessoas gritam,  falam alto,  falam em dialeto,  cantam, vendem polenta frita e espetinhos de peixe ou carne.  A rua é a sala de estar dos seus habitantes.  É na rua que as mulheres  fazem e vendem o orecchiete  -a massa típica da Puglia que tem a forma de uma orelhinha-, é na rua onde as crianças brincam, porque as casas não têm pátio ou jardim. Nesta zona medieval  que mais parece um laberinto  não existem calçadas, as portas se abrem sobre a rua, os carros, quando a largura permite,  passam quase tocando as paredes.  Motinhos e lambretas  vão e vem incessantemente, e em alta velocidade, roçando os turistas que descem de algum cruzeiro pra visitar o bairro.  Os moradores são obrigados a varrer e lavar a rua várias vezes ao dia pra evitar que o pó e a sujeira entrem dentro das casas, que têm apenas a porta de entrada, e portanto pecisam ficar abertas constantemente pra que possa haver  ventilação, apenas uma cortina separa a rua da parte interna da casa.  Nos dias quentes de verão as famílias jantam fora, isso quer dizer que colocam a mesa  em plena rua, ou então levam mesa e cadeiras até o outro lado da muralha que separa Bari Vecchia do mar, e na calçada sobre a avenida beira mar, o Lungomare, elas jantam.  Bari Vecchia foi sempre protegida pelas muralhas e ainda  conserva uma grande parte dela, lugar lindo pra caminhar e ter uma bela vista do mar Adriático. Dentro  desta encantadora cidade antiga estão inúmeras igrejas, todas belíssimas, entre elas se destacam a Catedral de San Sabino e a Basílica de San Nicola, dedicada ao patrono da cidade,  ambas do século XII, e grandes expressões do estilo românico pugliese. Outro monumento importante é o Castelo Svevo, construído pelo imperador Federico II no século XIII , alguns museus,  e a  Faculdade de Estudos Clássicos da Universidade de Bari .  O bairro é também repleto de bares e restaurantes,  alguns muito típicos, outros modernos, a vida noturna é intensa durante todo o ano, com muitos espetáculos  ao ar livre nas praças Ferrarese e Mercantile. Bari Vecchia é o espaço mais democrático da cidade, pois é frequentada não só pelos seus moradores como também pelos habitantes de toda Bari, e é ponto  obrigatório para os turistas.
Repito a foto aérea de Bari que usei no post anterior porque mostra praticamente Bari Vecchia inteira. À esquerda no canto inferior da foto se vê a Basílica de San Nicola, mais ao centro a igreja que se destaca é a Catedral de San Sabino. (Foto:web by Giuseppe B.)

As casas de Bari Vecchia

Loja de artesanato típico perto da Basílica, é aqui que se compra, como recordação, a imagem de San Nicola, o padroeiro da cidade, ou a cerâmica típica de Bari que tem um galinho como símbolo.

O burburinho de Bari Vecchia à noite.

Preparação do cortejo medieval de San Nicola em frente ao castelo Svevo.

Moradoras de Bari Vecchia fazendo o orecchiette na frente de suas casas.

O mar Adriático visto do passeio sobre a muralha.

Basílica de San Nicola

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

05 - BARI, A ILUMINADA

Bari é daquelas cidades iluminadas, a luz entra por todos os lados, pois está entre o mar e uma enorme planície, não existem montanhas onde o sol possa se esconder, a gente vê o nascer do sol desde os primeiros raiozinhos que começam a sair da terra (claro que só os que acordam cedo podem ter essa experiência, o que está longe de ser o meu caso), e depois, no fim da tarde dependendo em que parte da cidade se está, a gente vê o sol mergulhar no mar ou entrar de novo na terra. Bari tem luz nas quatro estações do ano,  chove pouco por aqui, tempestades são coisas raras,  em dois anos como habitante do lugar  vi só duas tempestades completas, ou seja, com direito à ventania, raios, relâmpagos, trovões, tarde que repentinamente vira noite, baldes de água que caem do céu...Os nativos se apavoram, até porque chuvarada de uma hora é o suficiente pra alagar a cidade e virar manchete da Gazzetta del Mezzogiorno (o jornal local) no dia seguinte.

Mas voltando à “capital da luz natural” (o título é invenção minha) do sul da Itália, Bari tem ótimas temperaturas, o verão é muito quente, as temperaturas estão sempre em torno aos 30 graus,  e o inverno é moderado, 12 à 15 graus durante o dia. Podem haver dias de extremo frio ou extremo calor, mas são exceções.  As boas temperaturas convidam à praia. Bari tem duas grandes praias públicas que ficam no centro da cidade, dois dados que chamam a atenção, primeiro por serem públicas, já que a maior parte das praias em toda a Itália são privadas, quer pegar uma praia? Então pague. São os indefectíveis Lidos, que têm permissão pra fechar a praia com uma cerca e cobrar entrada. E em segundo lugar porque  ficam no centro, espaço nobre que geralmente são concedidos à exploração privada.  Em Bari a prefeitura organizou duas praias, Pane e Pomodoro (adoro esse nome! Não é singelo uma praia que se chama Pão e Tomate? ), e Torre Queta, em ambas a população tem banheiros e duchas sem precisar pagar nada, além de parquinho pras crianças, espaço pra caminhar, jardins, bares.  Realmente uma comodidade.  

Então, quem pretende visitar a Itália no inverno europeu, e não curte muito o friozão e a neve, já sabe onde encontrar um inverno ameno.  Se a pessoa já conhece a Itália, faz uma parada de dois ou três dias em Roma, sempre vale a pena rever, e depois  vem pra Puglia de trem ou avião, Roma-Bari são 4 horas de viagem no trem Eurostar, e de avião são 50 minutos. Vocês não vão se arrepender!

Pane e Pomodoro no mês de agosto (a foto não é minha, foi publicada em dois jornais locais).
Pane e Pomodoro num feriado no início da primavera, no mês de maio.
Bari em pleno inverno
O pequeno cais, ao fundo o Forte e parte da muralha que protegia Bari Vecchia.


Que tal um giro por Bari? 
Pôr do sol na praia de Torre Queta


quarta-feira, 16 de novembro de 2011

04 - BARI

(Este post é pra Olívia, Bela, Cícero, Nilza, Claudia, Lana, Luis e Thanar)

Outro dia estava pensando que Bari e Porto Alegre têm algumas coisas em comum,  são capitais, estão no extremo sul do país, ambas possuem  um porto,  e as duas são cidades de passagem, aquele tipo de cidade que as pessoas dizem: “Ah! Sos de Porto Alegre? Pasé por allí cuando fui a Camboriú!”, ou então: “Estive em Porto Alegre só de passagem, do aeroporto o tour nos levou pra Gramado”.  

Bari é uma cidade que as pessoas conhecem por acaso, saem do aeroporto e vão direto pegar algum cruzeiro que vai pra Grécia e Turquia, no máximo dormem uma noite na cidade porque não conseguiram uma conexão imediata e o navio só parte na manhã seguinte.  Por  mais esforços que o governo da Puglia vem fazendo na tentativa de incluir Bari e toda a Região na rota do turismo internacional as pessoas só vêm especialmente até aqui quando já conheceram as mundialmente famosas Roma, Florença, Veneza e Milão,  depois tem ainda Nápoles e a Costa Amalfitana, a Sicília, as rotas do vinho pela Toscana...bom, se a pessoa já viu tudo isso, ainda assim virá a Bari porque tem algum amigo que mora na cidade.  E acho que essa é uma situação que não vai mudar nunca. Péssimo pra economia local, porém um alento pra quem vive aqui e está à salvo do turismo predatório. Os amigos e parentes que já vieram me visitar sabem do que eu estou falando (não disse? descobriram  Bari e a Puglia porque me conhecem!).  Todos foram unânimes em dizer  que tinham ficado surpreendidos com o que viram. Nos próximos posts vou contar um pouquinho da história de Bari, suas curiosidades, e dar algumas dicas pra quem quiser ampliar seu roteiro pela Itália.

Achei numa página do facebook, dedicada a Bari, esta foto aérea pra que vocês possam ter uma idéia geral da cidade. (foto by Giuseppe B.)

Um dos lugares de Bari que eu mais gosto é a cidade antiga, conhecida como Bari Vecchia.


Assim como em Porto Alegre o pôr do sol daqui é sempre um espetáculo!




terça-feira, 15 de novembro de 2011

03 - LUZES E FOGOS DE SAN TRIFONE

Ontem falei dos festejos de San Trifone,  e deixei pra hoje dois detalhes que fazem da festa uma experiência única: as luzes e os fogos.  Quando vim morar aqui ouvia os comentários de que no dia do santo faziam uma grande competição de fogos de artifício à tarde, sempre achei que havia alguma coisa errada,  afinal, não é à noite que queimam fogos de artifício?  No ano passado, minha estréia nas festividades, aprendi que os tais fogos eram na verdade uma competição de explosões.  Experiência “inenarrável” e quase surreal, eu diria. O povo todo vai pra beira de uma estrada e de lá acompanha a explosão de foguetes em campo aberto, participam seis concorrentes e a barulheira dura umas três horas. A estas alturas vocês devem estar se perguntando que raios se avalia num concurso desses, pois bem, avalia-se a altura que alcança o foguete, a potência da explosão, o ritmo, e por último a tão esperada “bateria final” quando o ritmo das explosões atinge tamanha velocidade que parece que a cidade está sob bombardeio. Este ano não fui assistir, fiquei em casa pra ver qual era a sensação, e parecia um verdadeiro terremoto. Qualquer vídeo que se assista não dá a real dimensão do “fenômeno”.  Em todo caso coloquei um vídeo pra vocês tentarem entender o que contei, coloquem no volume máximo e usem fones de ouvido!

Já as luzes...só encontro um adjetivo: sublime!  Iluminar as praças em dia de festas é uma tradição muito antiga do sul da Itália, quem viu Baaria, filme de Giuseppe Tornatore que se passa na Sicília no início do século XX, talvez lembre de uma cena em que aparece uma praça com esta iluminação alegórica. Dar luz às praças é uma arte que passa de geração em geração, são muitos os artesãos que criam este quebra-cabeça de madeira e lâmpadas que depois é montado, durante vários dias, pedaço a pedaço com grande paciência e habilidade.  Essas luzes emocionam,  envolvem o ambiente numa aura de passado, é comovente ver a expressão de velhos, adultos e crianças no momento em que elas são acesas oficialmente, a cara de deslumbramento diante da descoberta das cores e formas ,que durante a semana de montagem ficava apenas na imaginação de cada um.  Mas o que mais comove é o brilho nos olhos daqueles senhores de mais de oitenta anos, que são muitos em cidadezinhas como Adelfia, que já viram quase um século destas luzes, e ano após ano  “correm” em grupos pra praça, pra se surpreenderem com a atemporalidade das luzes de San Trifone.  




segunda-feira, 14 de novembro de 2011

02 - ADELFIA E SAN TRIFONE

Pra quem está pegando o bonde agora, eu explico, estou contando algumas curiosidades da cidadezinha onde vivo, Adelfia. No post de ontem tem a introdução, pra quem quiser saber um pouco mais.
Adelfia tem uns 17 mil habitantes, somadas as populações de Canneto e Montrone, não esqueceram da rivalidade, certo? Comparável somente aos Capuleto e aos Montecchio.
Adelfia tem também dois santos padroeiros, San Vittoriano protege Canneto e San Trifone abençoa Montrone. O primeiro se festeja no dia 23 de julho, e San Trifone, que tem a festa mais importante e mais bonita, e não digo isso por ser uma "montronese" desde criancinha, mas sim porque a festa de San Trifone faz parte do calendário de eventos da Puglia, e é uma das mais populares e multitudinárias do sul da Itália, se festeja no dia 10 de novembro, ou seja, foi na semana passada.
Conta a lenda que Trifone era um jovem pastor capaz de curar e exorcizar as pessoas. Nascido na Turquia no ano 232, foi um dos mártires do cristianismo, morreu decapitado porque se negou a obedecer as leis do Império Romano que obrigavam a adoração de deuses pagãos.  Já é possível imaginar quantos homens em Adelfia se chamam Trifone, o que realmente, neste caso, não dá pra considerar um benção!
Voltando à festa, ela dura uma semana! A cidade é literalmente invadida por forasteiros que vêm de todas as partes da Itália. Inúmeras procissões, música, dança, comida e bebida distribuída ou vendida a preços simbólicos, artistas de rua, ruas decoradas com estandartes e iluminação especial, bandas marciais que ficam num vai-e-vem o dia inteiro, incluindo uma bandinha que percorre as ruas durante a madrugada, sim, acordando os moradores todas as noites, e não interessa se alguém tem que levantar cedo na manhã seguinte, durante San Trifone isso é apenas um detalhe. As pessoas quando se encontram pela rua se cumprimentam dizendo "buon San Trifone", e é comum ouvir gritos de "...E Viva San Trifone!" a qualquer hora do dia. A festa culmina no dia do santo, 10 de novembro, quando fazem a grande competição de fogos artificiais diurnos, coisa que eu nunca imaginei que existisse, bom...mas isso é história pra amanhã.
As fotos abaixo mostram: 1. a imagem do santo durante a procissão.  2. as ruas tomadas.  3. a iluminação da praça principal.    4. a imagem do santo pintada por um "madonnaio", artistas que pintam imagens no chão. 5. pane e focaccia.




domingo, 13 de novembro de 2011

01 - ADELFIA

Então, pra começar a falar da Puglia nada mais justo que começar falando de Adelfia, cidadezinha onde vim parar de mala e cuia. A Puglia é uma das regiões do sul da Itália, que tem como capital a cidade de Bari.  Puglia, que em português se escreve Apulia, se divide em  seis províncias, e uma delas é a província de Bari onde se encontra  a cidade de Bari, capital da província e da região.  Bom,  Adelfia pertence à província de Bari e fica a 14 km da capital.   Ok, uma vez dadas as coordenadas posso contar alguma coisa da pequena Adelfia. A história, de uma forma infinitamente resumida, é a seguinte: existiam dois feudos,  Montrone (fundado em 982 d.C.) e Canneto (ao redor de 1067 d.C.), estes feudos estavam separados um do outro por  poucos metros de distância, entretanto as populações sempre tiveram muitas diferenças no que diz respeito as suas tradições, a sua história, e inclusive ao dialeto que não era o mesmo, o que durante séculos alimentou uma  grande rivalidade entre as duas cidades. Em 1927 o rei Vittorio Emanuele III assina o decreto que une as duas localidades, naquele momento Montrone e Canneto deixam de existir e passam a chamar-se Adelfia, do grego Adelfos, que significa “fraternidade”. Porém, até os dias de hoje a rivalidade persiste. Pra sua população Adelfia permanece dividida em duas zonas, Canneto e Montrone, e quando alguém diz que mora em Adelfia a pergunta salta: em Montrone ou em Canneto?!  Confesso que sempre me vêm uns segundos de dúvida na hora de responder, pois nunca se sabe de que parte da cidade é o interlocutor, e que cara vai fazer diante da resposta. A essas alturas vocês também devem estar se perguntando em que lado eu moro, bom, já sou praticamente uma "montronese"! Essa história não é o cúmulo do bairrismo? E eu que achava que por ser gaúcha já era diplomada no assunto! 
Espero que gostem das fotos!






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Quando eu dizia, há dois anos atrás, que vinha morar em Bari, muitos perguntavam espantados:
"- Em Bali?! Por que tão longe?", ou então: "Bari... Bariloche?". Não bastava dizer somente Bari, tinha que dar as coordenadas geográficas: sul da Itália, no salto da bota, às margens do mar Adriático, com vista pra Grécia e pra Albânia, só assim ia situando um pouco as pessoas. Hoje estou aqui, em Bari, capital da Puglia, e finalmente decidi contar parte dessa aventura. Este blog vai ser uma espécie de colcha de retalhos, se eu tiver tempo pretendo falar de tudo que gosto e me interesso, mas quero principalmente falar desta terra fantástica. Bem-vindos!