Quando eu dizia, há dois anos atrás, que vinha morar em Bari, muitos perguntavam
espantados: "- Em Bali?! Por que tão longe?", ou então: "Bari...
Bariloche?". Não bastava dizer somente Bari, tinha que dar as coordenadas
geográficas: sul da Itália, no salto da bota, às margens do mar Adriático, com
vista pra Grécia e pra Albânia, só assim ia situando um pouco as pessoas. Hoje
estou aqui, em Bari, capital da Puglia, e finalmente decidi contar parte dessa
aventura. Este blog vai ser uma espécie de colcha de retalhos, se eu tiver tempo
pretendo falar de tudo que gosto e me interesso, mas quero principalmente falar
desta terra fantástica. Bem-vindos!

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

13 - FISCHIETTI DI TERRACOTTA

Aqui pertinho de Adelfia, a uns 10 km mais ou menos, fica a cidade de Rutigliano, uma pequena cidadezinha de 18 mil habitantes conhecida como a capital da Uva Itália, mas também conhecida como a capital do fischietto di terracotta.  Um fischietto é um apito, nada de especial , afinal quem não conhece um apito?  Só que em Rutigliano o apito virou arte em cerâmica, uma belíssima e divertida arte desenvolvida pelos habilidosos artesãos locais.  Os fischietti de cerâmica são conhecidos em toda a região desde tempos remotos. Todos os povos que passaram pela Puglia trabalharam a argila vermelha, que é abundante nestas terras, e criaram desde objetos de uso doméstico e decoração, até objetos lúdicos como o caso dos apitos.  Até o século XIX os fischietti tinham formas de pequenos animais como pássaros, sapos, gatos, galos.  A figura do galo, por exemplo,  era símbolo de virilidade e de fertilidade, por isso era tradição que o noivo presenteasse  a sua noiva com uma cesta de uvas e um fischietto em forma de galo. Mais tarde o espírito satírico, típico da cultura popular, invade a tradição dos fischietti e os artesãos começam a criar figuras que representam personagens populares representados de forma irônica ou grotesca. Hoje em dia se realiza em Rutigliano a Feira do Fischietto in Terracota, que tem edição anual e coincide com o dia do padroeiro da cidade, San Antonio Abate, 17 de janeiro. Organiza-se uma semana de festividades,  com exposições e vendas de fischietti, comida típica, música, e o tradicional Concorso Nazionale dei Fischietti, no qual participam artesãos de toda a Itália. Um júri técnico e um júri popular escolhem os vencedores nas diversas categorias.

Bom, pra comprar um fischietto não é preciso ir a Rutigliano, ele é uma espécie de produto que se encontra em lojas de artesanato em toda a Puglia.  Mas  é interessante também conhecer o Museu , que está em Rutigliano, onde expõem as obras dos vencedores de todas as edições do concurso, que existe há 24 anos. 

Aqui deixo as fotos que fiz no Museu do Fischietto, na semana passada, em Rutigliano.
O cartaz da Feira e do concurso deste ano.

Fischietto que ganhou o primeiro lugar na categoria profano. Representa o ator Roberto Benigni em uma de suas eternas críticas a Berlusconi.


Um dos concorrentes deste ano. A crítica à igreja está sempre presente.

Outro concorrente de 2012.  A nonna fazendo orecchiette.

Os próximos são os vencedores dos anos anteriores que ficam em exposição permanente no Museu.


As brincadeiras de antigamente.

Berlusconi e Romano Prodi. A crítica aos políticos.

O atual Presidente da República, Giorgio Napolitano, costurando o que resta da Itália.

Os padres, a igreja, e os políticos são os alvos preferidos das críticas.


As donas-de-casa das cidades do interior que das sacadas das casas cuidam a vida alheia.


Uma representação mais atual do tradicional fischietto do galo.




Santo Antonio Abate, padroeiro da cidade de Rutigliano e protetor dos animais.



Fischietti que estão à venda em diversas lojas por toda a Puglia.


Os tradicionais galos.

Este é o link de uma artista da cidade de Matera que faz fischietti tradicionais, mas também releituras, ela tem um trabalho muito bonito, seu nome é Maria Bruna Festa.


sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

12 - LA BEFANA


Bem, aqui estou eu de volta, deixei o blog um pouco abandonado por causa do trabalho e das festas de fim de ano.  Mas ainda dá tempo de dizer Feliz Ano Novo pra todo mundo. E como eu sou uma pessoa positiva e otimista, e tenho a tendência a acreditar (ainda) no ser humano, quero sonhar com um 2012 bem bacana e bem humano, no sentido que aprendi quando era pequena, o de bondade, generosidade, compreensão e tolerância. Terminada a introdução,  hoje eu precisava escrever pra contar sobre a Befana, o personagem principal do dia 6 de janeiro em toda a Itália. Dia 6 de janeiro é o Dia de Reis, todo o mundo cristão sabe disso, na Itália também se festeja os reis magos, porém quem traz os presentes não são eles e sim a Befana.  Uma espécie de bruxa boa que chega voando numa vassoura trazendo nas costas um saco com presentes pras crianças que se comportaram, e carvão pras que foram mazinhas.  No período natalino a criançada manda a tradicional carta pedindo os brinquedos pra Befana, e não pro Papai Noel, ou ainda pros Reis Magos como se faz na Espanha.  A tradição da Befana é muito antiga, e possivelmente está ligada a tradições pagãs da época do Império Romano.  Na décima segunda noite após o solstício de inverno os romanos celebravam a morte e o renascimento da natureza através de uma figura pagã chamada Madre Natura. Acreditavam que nas doze noites após o solstício figuras femininas voassem sobre os campos recém semeados garantindo assim uma boa colheita. Essa crença foi fortemente condenada pela igreja depois da cristianização do Império Romano, e assim pra que sobrevivesse até hoje sofreu  muitas variações chegando na Idade Média à figura da atual Befana. A palavra é uma corruptela de “epifânia” que significa revelação ou manifestação, e é como se chama o dia 6 de janeiro na Itália: l'Epifania.  Como a igreja nunca conseguiu acabar com a tradição da Befana criou-se uma visão “cristianizada” que conta que os Reis Magos não encontrando o caminho de Belém pediram ajuda à uma senhora idosa (a Befana é sempre representada por uma velha), que se negou a ajudá-los, porém arrependendo-se decidiu procurá-los batendo de casa em casa entregando doces às crianças que encontrava, na esperança de que uma delas fosse o menino Jesus. E essa história terá também outras tantas versões.  Mas  no final das contas, ou a Befana, ou o Papai Noel, ou os Reis Magos, a idéia é sempre a de presentear.  Atualmente se faz a troca de presentes na noite do dia 24, e no dia da Befana se presenteia de novo somente as crianças. Também é um costume generalizado presentear meias cheias de doces e chocolates, neste caso até os adultos entram na brincadeira.
 "Befanas" nos mercados de rua.


Uma rua da cidade de Urbania, na região do Marche, preparada pra receber a Befana.